segunda-feira, 1 de julho de 2019

"No dia em que eu descobri que amor não mata"



Ele era o menino que eu gostava. Era por quem eu passava horas me arrumando na saída do colégio, exagerando no batom para parecer mais velha. Ele era quem eu espiava nos intervalos da aula e suspirava sozinha olhando a quadra. Ele me fazia tremer, me fazia esquecer o que eu ia dizer, me fazia passar vergonha de tão nervosa que eu ficava. Ele não me dava a menor bola, mas naquele dia me ligou. Disse que conseguiu meu telefone com uma amiga, que tinha lembrado de mim e me escrito uma carta. Corri até o shoppinzinho para comprar o CD, mas não consegui aguentar o suspense e ouvi a letra nos headphones da loja. Era um pedido de desculpa que no final me perguntava se já era tarde.⠀

Não era. Na verdade, era bem cedo. Aquilo era só o começo de uma avassaladora paixão adolescente, com beijos demorados, telefonemas intermináveis e apelidos constrangedores. ⠀

Nosso namoro durou dois anos. Quando terminou, achei que eu fosse morrer. Chorei até ficar cansada, emagreci, escutei obsessivamente o mesmo álbum do Tim Maia. Mas aí aconteceu uma coisa inesperada: eu sobrevivi. E ter sobrevivido, para mim, foi tão definitivo quanto ter amado. No dia em que eu descobri que amor não mata, eu fiquei mais cética em relação a toda aquela loucura e passei a encarar aquela empolgação como algo passageiro. Passei a usar com mais cuidado o sempre e o nunca, entendi que a gente muda.⠀

No dia em que eu descobri que o amor não mata, eu parei de morrer por amor, mas hoje, sem querer eu escutei aquela música. Fui arremessada para janeiro de 98 e consegui me lembrar exatamente como me sentia. Deu vontade de voltar no tempo só pra poder cochichar: "cruza essa ponte, querida, e vive a parte mais mágica da sua vida. Não se culpe, não se desculpe, porque isso não volta. Pode ser que não seja amor, que seja paixão, mas não importa. Aproveite o que você está sentindo."⠀

Sarah Westphall || @csv.oficial